Um ano de cinematografia: avaliado

Ericeira de São Luís
5 min readDec 27, 2021

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Dia 25 de dezembro do ano passado comecei uma lista pessoal no bloco de notas com o intuito de anotar o que fosse assistindo durante o ano seguinte, entre filmes e séries (não necessariamente lançados em 2021). Faço aqui breve recapitulação elegendo os 3 melhores filmes e as 3 melhores séries, o que serve de louvor publico ao que há de bom nessas obras, mas também indicação a quem interessar. Farei crítica simples de cada um dos escolhidos, chamando atenção para os pontos fortes e aplicando nota de 0 a 10. Evitarei ao máximo spoilers e nem mesmo falarei da sinopse — espero que isso leve o leitor a pesquisar sobre, e, quem sabe, assistir

3 Filmes

Estômago (2007) — Disponível na Netflix

Filme do diretor Marcos Jorge lançado apenas esse ano no catalogo da Netflix, que com surpresa descobri já tem seus quatorze anos de idade. O ponto forte é a narrativa agradável, domesticada, previsível e, paradoxalmente, surpreendente. Os predicados da narrativa são encarnados pelo protagonista (ou será que é o contrário — sendo a narrativa a encarnação do protagonista?), atuado com maestria por João Miguel. Vejo aqui o cinema brasileiro naquilo que há de melhor.

Nota: 9/10

Den Skyldige (2018) — Disponível no Prime
Locke (2013) — Disponível em HBO Max

Cito os dois próximos filmes (com certeza os melhores do ano) juntos pois ambos executam com maestria as mesmas coisas, sendo até estruturalmente semelhantes.

Aqui percebe-se todo o poder de um roteiro bem escrito, fato já demonstrado há mais de sessenta anos pelo magistral 12 Angry Man. Como não podia ser diferente, filmes de uma só locação, cujos mais intensos esforços se voltam para o roteiro, devem ser arrematados por atuações efetivas. Tanto o dinamarquês Jakob Cedergren em Den Skyldige, como o inglês Tom Hardy em Locke alcançam um nível que supera em muito o apenas efetivo, coroando obras que são tão simples quanto poderosas.

Obs.: O Filme dinamarquês citado aqui, Den Skyldige, recebe o título inglês The Guilty. Recentemente a Netflix lançou sua própria versão do filme com atuação de Jake Gyllennhaal e mesmo título inglês. Fica o aviso apenas para que não se confundam os dois. Do último nada posso dizer, pois ainda não o vi, ainda que de pronto não compreenda o “remake” de uma obra impecável.

Nota: 10/10

3 Séries

Underground Railroad (2021) — Disponível no Prime

O diretor Barry Jenkins tinha aqui uma missão complicada: a de dirigir uma série sobre um tema que já foi explorado intensamente, e cujos representantes mais conhecidos, como 12 Years a Slave (2013) são verdadeiras obras — primas. O resultado é que ele é bem sucedido em sua empreitada, demonstrando que mais importante do que originalidade temática é a execução competente. A direção somada à cinematografia deslumbrante, esfumaçada, quase onírica, contrastando à crueza e terrível verossimilhança do tema, bem como a atuação impecável da atriz Thuso Mbedu produzem algo que é tão familiar quanto memorável.

Nota: 9/10

Mindhunter (2017–2019) — Disponível na Netflix

No lugar dessa colocaria The Wire (2002–2008), consagrada série da HBO, que a supera em todos aspectos técnicos e que tive o deleite de assistir também esse ano. A escolha que fiz só confirma a ideia básica de que a experiência cinematrográfica não se iguala aos aspectos ténicos, ainda que eles sejam imprescindíveis. Mindhunter, assim como Underground Railroad, explora um tema já colonizado, inclusive pelo seu produtor-executivo David Fincher, que tem no currículo nada menos que Se7en (1995) e Zodíaco (2007) . Há, entretanto, nessa série, uma mistura de elementos — trilha sonora, narrativa, cinematrografia, atuações, e sobretudo aquele das reflexões acadêmicas em ciências sociais trazidas pela própia narrativa— que a tornaram inesquecível, apesar dos defeitos. Com desapontamento soube que seria cancelada na sua segunda temporada.

Nota: 9/10

The Sopranos (1999–2007) — Disponível na HBO Max

A descoberta do Streaming da HBO foi uma das boas surpresas do ano. Há certo selo de qualidade nas séries desse canal (o que nem sempre é o caso dos filmes), visto que mesmo suas produções mais fracas são melhores que a maioria. Em The Sopranos vemos outro tema explorado à exaustão, mas ao contrário das outras duas menções acima, trata-se de um precurssor. A premissa básica que gira em torno da soma dos elementos Família (stricto sensu)+ Crime, consagrados em narrativas de tempos mais recentes, como Breaking Bad (2008–2013) e Ozark (2017 -), para citar apenas dois exemplos, já atingia a maturidade aqui. Talvez possa-se dizer até que Antony Soprano é prototipo de Walter White e Marty Bird. Como nos melhores feitos em cinema e tv, nada está em tela por acaso nessa série. Meros detalhes, simples dialogos ressurgem três ou quatro temporadas mais tarde para assombrar personagens e espectadores. A tensão cuidadosamente construida, tomando todo tempo necessário ( o que talvez desencoraje os que não tem paciência com desenvolvimento de personagens, ou seja, com profundidade narrativa), se estabelece em quem assiste, de modo que perto do final, mesmo os atos mais banais dos personagens, como comer num restaurante ou andar na rua, tornam-se asfixiantes.

Nota: 10/10

Menção Honrosa:

Sons of Anarchy (2008–2014) — Retirado recentemente do Prime Video.

Assistir Sons of Anarchy foi uma experiência única , apesar do ceticismo inicial quanto as possibilidades do tema me agradar. Basicamente seus acertos são os mesmos de The Sopranos (ainda que menos exemplares, e de forma mais atrapalhada), como era de se esperar dadas as semelhanças no argumento. O brilho máximo aqui recai sobre o protagonista, Jax Teller, interpretado por Charlie Hunnam, que conquista esse posto pouco a pouco. No fim, temos um personagem tão complexo e cativante que me peguei em certos momentos imitando alguns de seus trejeitos, como a forma de andar. Recentemente inclusive, saindo para comprar um tênis novo, fiz questão de um branco: uma homenagem à (inglória) lembrança de Jax.

Nota: 9/10

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